Danilo Bueno

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Prova incontestável veio após a morte de Marielle Franco, onde ondas polarizadas de ódio extremo dominaram as emoções nas mídias sociais e envolveram até mesmo uma Desembargadora.

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A moderna denominação ‘Fake News’ em si, não tem nada de moderno, é a surrada notícia falsa que sempre esteve presente em todo canto do mundo mas, que ganhou notória presença após o processo eleitoral norte-americano que culminou com a eleição de Donald Trump e desde então, muitos profissionais tem se debruçado a entender este fenômeno que preenche a internet mundial e que parece sólido como rocha no Brasil.

Uma equipe da Globo News investigou a onda Fake News nas eleições dos EUA e chegou até um país desconhecido pela maioria das pessoas, a Macedônia e produziram o documentário: “Fake News – Baseado em fatos reais” (exibido em setembro de 2017).  Os jornalistas André Fran, Rodrigo Cebrian e Felipe Ufo conseguiram localizar as pessoas por trás da rede de notícias falsas e entrevista-las pra descobrir qual era sua motivação e a surpresa veio ao descobrir-se que a mente por trás das notícias inverídicas era um jovem de 16 anos que foi muito bem sucedido em suas ações e fazia isso em troca dos milhares de dólares semanais que ganhava do Google através de publicidade em suas páginas.

No Brasil, entretanto, sabe-se que o buraco é mais em baixo.  Motivações financeiras há, sem dúvida pois, como diz um antigo ‘mantra’ do marketing: “não existe almoço grátis”.  Recentemente, a BBC Brasil divulgou uma investigação que encontrou uma rede de fake news que teria sido utilizada pela campanha de Dilma Rousseff para ‘fortalecer suas virtudes e atacar adversários’.

Também ocorreu no fato mais recente, do assassinato da vereadora carioca Marielle Franco a ativação de uma rede de ‘bots’ (termo utilizado para designar códigos de inteligência artificial que automatizam ações) para disseminar pela web, sobretudo mídias sociais, provocações injuriosas, informações falsas e assim atiçar os mais desatentos que saem compartilhando tudo pela frente, sem questionarem a veracidade da informação que estão impulsionando.

José Padilha, diretor consagrado dos filmes Tropa de Elite 1 e 2 que foram rodados no cenário carioca e com acontecimentos fictícios que são muito próximos da realidade conhecida da cidade e do Brasil, disse em uma entrevista recente à Veja que “a corrupção é a lógica da democracia brasileira”.  Isso é lamentável mas, é verídico.  Não há qualquer escrúpulo dos agentes quando o tema é PODER.

Depois que Nicolau Maquiavel escreveu sua famosa obra imortal – ‘O Príncipe’ – em que crava a máxima: “o fim justifica os meios”; sobretudo ao caso brasileiro posso dizer que a lição foi muito bem assimilada e continua em aplicação por todos os lados de nossa política.  Não importa a designação – direita, centro ou esquerda – são todos igualmente oportunistas e agarram-se ao que puderem se sentirem que podem tirar proveito da situação.  E no Brasil é muito forte o conceito de ‘liderança’ e ‘liderados’ pois, o comportamento de manada é predominante e está presente em todas as classes sociais, indiscutivelmente.

Mas, voltando ao tema em tela, segundo pesquisa realizada pela FGV (Fundação Getúlio Vargas), 1.833 ‘bots’ foram utilizados para disseminar inverdades sobre a pessoa de Marielle Franco e também para gerar comoção nacional, influenciando, assim, o comportamento de milhões de outros que replicaram sem questionar.

A apuração da FGV analisou publicações que ocorreram no período das 21h00 de quarta-feira (14) até às 10h30 da quinta-feira (15).  Estes robôs representaram 5% do total de tuítes, que atingiu 1.172.000 mensagens com 336.475 usuários únicos na mídia social Twitter.  Segundo o pesquisador Amaro Grassi, que integrou o estudo, “a polêmica vai se politizando de uma forma que os grupos mais organizados começam a acionar as suas estruturas”, disse.  Assim, estes ‘bots’ foram tanto para disseminar o ódio e a discórdia, quanto para impulsionar a dramatização da morte trágica, gerando forte clamor. “É uma característica do ambiente digital, ter este tipo de atividade.  Tanto os positivos, usados para atendimento, como os robôs maliciosos, que tentam distorcer o debate”, afirmou.

A FGV/DAPP tem um importante histórico analítico do uso de inteligência artificial para a manipulação de sentimentos na internet.  O instituto coleciona já, 15 casos de uso de ‘bots’ que vão desde o impeachment de Dilma Rousseff, como o julgamento do ex-presidente Lula pelo TRT4 em janeiro deste ano.  Um comparativo quantitativo entre o período de Dilma e o momento atual de Marielle; com Dilma registrou-se que 20% de tudo o que circulou na internet brasileira era proveniente de ‘bots’, portanto 4x mais que as mensagens sobre o assassinato da vereadora.

A informação chega a ser tão convincente para alguns, que é natural impulsionar.  Assim ocorreu com a desembargadora do TJ-RJ (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro), a segunda instância jurídica daquele estado.  Marília Castro Neves, é magistrada daquele tribunal e disse posteriormente que nunca havia sabido de Marielle até aquele instante mas, isso não impediu-a de impulsionar inverdades sobre a vítima do brutal assassinato, onde, dentre outros fatos, atribua à Marielle a associação ao crime organizado.  Pelo fato de ser uma juíza de tribunal de segunda instância, certamente que seu ato avalizou as informações errôneas que publicou e impulsionou uma série de outros desatentos que replicaram automaticamente, sem fazer o menor raciocínio de que aquilo poderia estar incorreto.

Este é o comportamento de manada ao qual me referi no início deste texto.  É o ato irracional de executar uma ação seguindo uma tendência. Isso me fez relembrar de um importante ensinamento que tive ainda na adolescência de meu professor de matemática, por uma questão de bullying escolar, ele dizia que antes de sairmos afirmando algo sobre alguém, deveríamos fazer o uso das ‘3 peneiras de Sócrates’.  Na história contada por ele, um discípulo do consagrado filósofo grego teria chegado afoito para contar um fato sobre alguém e antes dele prosseguir, Sócrates teria interrompido perguntando se ele havia feito o uso das 3 peneiras, onde a primeira seria a verdade, a segunda seria a necessidade e a terceira a utilidade do que se teria a dizer e concluía com o ensinamento de que se a resposta fosse negativa para qualquer uma das peneiras, aquele fato não deveria ser propagado pelo princípio da preservação moral.

É o que justamente não ocorre em nossa sociedade, a preservação moral.  Por mais que pudesse ser verdade que Marielle tivesse algum vínculo com o crime organizado, qual seria a necessidade em dizê-lo?  E ainda que fosse necessário espalhar a notícia, qual seria a utilidade para a sociedade?  Em que poderia mudar ou ajudar a solucionar aquela situação?  Falta de bom senso, é o mal que perece nossa sociedade e tudo isso faz-me pensar e ficar atemorizado com o futuro próximo das eleições gerais majoritárias e proporcionais.

Parafraseando uma notória figura condenada e quase folclórica, “nunca antes na história desse país” tanta mentira terá circulado com aparência de verdade absoluta.  E por não saberem questionar, penderão o raro momento da definição do futuro do país para o lado da injustiça, da mentira e da corrupção, novamente.

 

Tem lições que parecem difíceis de serem aprendidas por muitos.

 

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