Marcos da Costa

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“A renovação dos quadros partidários mostra que os compromissos do eleitor com o partido são tênues ou mesmo inexistentes. No Brasil, vota-se na pessoa e essa é uma das raízes da equação da infidelidade partidária”

Ponto número um: sem reformar os métodos da política, o Brasil continuará no mesmo lugar.

Ponto número dois: a reforma da política implica vontade e esta depende exclusivamente dos congressistas, eis que a sociedade há muito clama por esta meta.

Por onde começar? Pelas portas que precisam ser abertas no edifício político, entre elas, a organização e o funcionamento de partidos, a escolha de candidatos, o sistema de voto, o processo eleitoral, as condutas dos agentes públicos em campanhas. O sistema de voto, por exemplo, abarca os votos distrital, puro ou misto. Qual o mais adequado? O sistema partidário, por sua vez, implica implantar a cláusula de barreira, pela qual se impõem regras para a existência e o funcionamento de partidos. Como se sabe, aquele dispositivo foi atropelado pelo Supremo em julgamento ocorrido há anos. Como um partido que tenha um único parlamentar pode ter os mesmos direitos de outro com imensa representação?

Já é consenso de que a fragmentação partidária, com 35 partidos, é perniciosa para o sistema democrático, eis que siglas sem densidade eleitoral servem apenas para engrossar o tempo eleitoral da outras, após vergonhosas negociatas que ocorrem geralmente por ocasião dos pleitos.

Ou seja, do atual numero de partidos, apenas pouco mais de meia dúzia agrega condições para formar uma coalizão e menos ainda denota um expressivo nível de polarização ideológica a ponto de gerar fortes correntes de opinião. Estudos realizados pela Universidade de Notre Dame, nos Estados Unidos, indicam que, entre 39 países pesquisados, o Brasil está em 31o no aspecto da escolha eleitoral por ideologia. E no que diz respeito à taxa de coesão ideológica dos eleitores dos três maiores partidos, em cada um desses países, o Brasil fica com um dos últimos lugares.

Outro ponto importante é a fidelidade. Mudar de partido, fenômeno que vem se avolumando desde o princípio dos anos 90, não apenas solapa a noção de representação, base da democracia liberal, como contribui para destroçar a imagem já desgastada de siglas e políticos. Não é à toa que um quarto do eleitorado não se lembre em quem votou para deputado federal ou estadual, logo após as eleições, índice que aumenta para mais de 50% após quatro anos.

Mas a fidelidade partidária e o financiamento público de campanha, dois instrumentos que começam a formar consenso, não conseguirão, por si só, reforçar o sistema partidário e moralizar o processo político. Nenhuma reforma calará fundo, caso não se volte para as causas da deterioração do sistema político. Os partidos precisam se imbuir de doutrina de forma a clarificar para a população seus programas. O que distinguirá uma sigla de outra no campo da saúde, da educação, da segurança pública, da mobilidade urbana? Ideário. Só com ideias, os protagonistas encontrarão conforto para permanecer em seu núcleo partidário. Claro, se não concordarem com as propostas devem migrar para outra sigla.

A renovação dos quadros partidários mostra que os compromissos do eleitor com o partido são tênues ou mesmo inexistentes. No Brasil, vota-se na pessoa e essa é uma das raízes da equação da infidelidade partidária.

Outro aspecto é a propaganda eleitoral, cujo foco deve ser o debate entre candidatos e não a ênfase na modelagem desenhada por profissionais de marketing. A quase nula identificação entre político e partido se deve ao fato de não termos mecanismos que vinculem os atores a mínimos compromissos partidários. Portanto, os debates eleitorais deverão ocorrer no plano das ideias, o que requer visão transparente e objetiva das demandas prementes da sociedade.

Evitaremos, também, a intensa competitividade entre atores de um mesmo partido, atenuando o individualismo eleitoral. O sistema de voto em lista fechada também pode ser um mecanismo para reforçar o partido. Quanto ao financiamento de campanhas, assinale-se que a doação de recursos por parte de pessoas jurídicas tem demonstrado grandes distorções. Alguns partidos acabam sendo mais aquinhoados e, dessa forma, as campanhas ficam desiguais.

A OAB-SP, por meio de uma Comissão formada por ilustres advogados, está preparando sua proposta para reformar a política.

As crises que assolam o país – política, econômica, ética, de gestão – sugerem que este é o momento para se fechar o ciclo da velha política.

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