Proposto pelo Poder Executivo, o Projeto de Lei 3/2024 foi apresentado com o objetivo de acelerar e dar transparência às recuperações judiciais, mas foi debatido e aprovado na Câmara a “toque de caixa”. Advogado especialista analisa pontos de atenção do PL
O sistema de insolvência brasileiro tem sido cada vez mais testado por causa do aumento da inadimplência entre as empresas. De acordo com pesquisa da Serasa Experian, o país alcançou em janeiro de 2024 um número de 6,7 milhões de companhias com dívidas. Segundo a entidade de análise de crédito, houve um aumento de cerca de 300 mil empresas endividadas entre janeiro deste ano e janeiro de 2023.
Acompanhado das recuperações judiciais vieram as falências, que também cresceram. No ano passado, 923 empresas pediram falências, enquanto em 2022 o número foi de 866, o que representa um aumento de 13,5%.
Neste contexto de desafio econômico, temos uma discussão relevante atinente às alterações legislativas na lei de Recuperação Judicial, trazendo certas incertezas ao mundo corporativo, uma vez que, mesmo com mudanças recentes promovidas pela lei 14.112/2020, o Congresso Nacional recebeu em janeiro o Projeto de Lei (PL) 3/2024, encaminhado pelo Poder Executivo, que pretende alterar novamente a estabelecida Lei de Recuperação Judicial. O texto foi encaminhado em regime de urgência constitucional após a chegada no Congresso, e recebeu alterações de Dani Cunha (União-RJ), deputada relatora do PL.
Ponto relevante desta proposta de alteração, fez com que fosse criada a figura do gestor fiduciário, que terá a incumbência de elaborar o plano de falência e preparar a venda de bens da empresa para custear as despesas com o processo falimentar.
O advogado Felipe Reis, mestre em Direitos Coletivos, Cidadania e Função Social e sócio-diretor do escritório Reis Advogados, referência no segmento financeiro e que atende as principais instituições financeiras do país, explica que os especialistas acompanham com cautela as possíveis mudanças.
“O andamento no Congresso tem trazido insegurança jurídica, pois o projeto foi revisado e encaminhado para aprovação em apenas 48 horas, sendo que os projetos que envolvem a matéria levaram décadas para serem aprovados. São decisões que podem impactar diretamente a relação entre empresas e seus credores e, por isso, devem ser avaliadas criteriosamente”, argumenta o especialista.
Em março de 2024, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) pediu o “aperfeiçoamento” do projeto de lei, alegando o risco de maior morosidade no recebimento de crédito e aumento de juros e spreads bancários, o que prejudicaria diretamente empresas de pequeno porte. Em nota oficial, a Federação declarou que “as novas condições para responsabilização dos sócios e administradores […] estão no sentido inverso ao desejado pelo projeto de lei”.
O advogado Felipe Reis comenta que o PL 3/2024 impacta fortemente a Lei de Recuperação Judicial e altera vários pilares importantes do regimento atual. O especialista elenca pontos controversos levantados pelo PL 3/2024:
Redução do debate democrático: a tramitação em regime de urgência pode limitar o debate democrático e a análise aprofundada das emendas, resultando em uma legislação que não reflete adequadamente os interesses de todas as partes envolvidas.
Judicialização excessiva: a proposta permite que os credores customizem soluções para pagamento e alienação de ativos, o que pode levar a uma falta de uniformidade e previsibilidade nos processos, dificultando a gestão de riscos pelas instituições financeiras.
Gestor Fiduciário: O advogado especialista ainda destaca sobre a criação da figura do gestor fiduciário — que será eleito pela Assembleia Geral de Credores — que terá o objetivo de montar o plano de falência e conseguir a venda de bens para arcar com as despesas do processo e pagar os credores. Segundo Felipe Reis, a preocupação se encontra no âmbito da possibilidade de os próprios falidos através de “laranjas” adquirirem mediante cessão de créditos, valores que dariam quórum necessário à escolha da figura do gestor, sem qualquer previsão de controle legislativo, trazendo insegurança sobre a governança do processo falimentar.
Falta de uniformidade e previsibilidade nos processos: o PL 3/2024 tem ainda o plano de falência, que contará com a proposta de gestão de recursos da massa falida, estratégias para a venda de bens, informações relevantes sobre a compra de bens da massa falida por meio de créditos dos credores e sugestão de como conduzir processos judiciais, administrativos e arbitrais dos quais a massa falida seja parte.
O projeto propõe que o plano seja elaborado pelo administrador judicial, que é uma pessoa provisória no processo. Isso acaba fazendo com que um arcabouço importante seja feito por alguém que não ficará até o final do processo.
“O PL 3/2024 gera uma falsa impressão de aumentar a celeridade dos processos falimentares, ante a burocracia inserida no projeto. Essas desvantagens podem impactar negativamente na eficiência dos processos de recuperação judicial e falência, afetando a confiança no sistema”, conclui Reis.
Sobre o Reis Advogados
Fundado pelo Dr. Paulo Roberto Joaquim dos Reis, o Reis Advogados mantém um compromisso contínuo com o desenvolvimento de gestão, tecnologia e excelência operacional. Referência no segmento financeiro, o escritório expandiu sua atuação ao longo dos anos e atende hoje empresas do setor Cooperativo, Energia, Securitário e da Construção Civil atuando em Recuperação de Crédito, Recuperação Judicial, Contencioso Consumerista e Trabalhista Empresarial.
Contando com mais de 600 colaboradores alocados por todo território nacional, tem em seu portfólio 8 das 10 principais instituições financeiras do país, se consolidando como um dos maiores escritórios de advocacia do mercado corporativo.
Além da sua sede em Bebedouro, o Reis Advogados conta com unidades em São Paulo e Ribeirão Preto (SP), Rio de Janeiro (RJ), Belo Horizonte (MG), Porto Alegre (RS), Florianópolis (SC), Curitiba (PR) e no exterior, em Oeiras (Portugal).