Terapia com Estimulação Magnética Transcraniana (EMT) já é a primeira escolha em muitos países, mas no Brasil sequer é conhecida pela maioria dos médicos
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Doenças que têm como pano de fundo as funções cerebrais existem desde sempre. O que mudou neste panorama, pode-se dizer, é a modernidade: tanto para as causas – entre elas estresse por excesso de trabalho, rotina corrida, influência das redes sociais e longevidade – quanto para as soluções advindas do avanço da medicina, como diagnósticos mais precisos, pesquisas em campos mais abrangentes e tratamentos mais assertivos.
Em relação a novas terapias para alterações no cérebro, é importante que sejam menos agressivas e apresentem menos efeitos colaterais. Afinal, o que menos deve acontecer neste âmbito é a geração de traumas.
Há uma maneira indolor, não invasiva e isenta de medicação para tratar – ou apoiar o tratamento em andamento – de problemas como depressão, zumbido, transtornos bipolares, alucinações em pacientes esquizofrênicos, reabilitação de pacientes com sequela de AVC (Acidente Vascular Cerebral), dores crônicas e em crianças autistas: é a Estimulação Magnética Transcraniana (EMT), que traz resultados bastante eficazes.
Aprovada para uso no Brasil em 2012, a técnica ainda é pouco conhecida e com disponibilização restrita. De acordo com a Dra. Juliana Zuiani, neurocirurgiã em Campinas que oferece o tratamento em sua clínica, alguns centros de referência disponibilizam o método pelo SUS, a exemplo do Instituto de Psiquiatria da USP. Apesar de já estar bem validado, não consta no rol dos convênios da ANS (Associação Nacional de Saúde Suplementar).
De acordo com a Dra. Juliana, para cada doença há parâmetros de estimulação, direção de posicionamento do equipamento no crânio, intensidade do estímulo magnético e tempo médio de sessões e tratamento, entre outras regulações para a aplicação.
Como funciona
Na EMT, uma bobina similar a um capacete é disposta na cabeça do paciente. Esse aparelho emite pulsos magnéticos que atuam sobre o cérebro de forma dirigida, sem necessidade de corte e sem causar dor. Durante a aplicação, o paciente fica acordado e pode voltar para casa assim que a sessão terminar. A Dra. Juliana garante que a técnica é segura e não apresenta efeitos colaterais. Segundo ela, alguns pacientes registram um pequeno desconforto enquanto ocorre o procedimento. “Diferentemente de outras terapias, ela não acarreta prejuízos à cognição”, frisa ela.
A Dra. exemplifica: “Se tomarmos a depressão como modelo, o campo magnético criado pelo equipamento vai gerar uma corrente elétrica em área específica do cérebro, nesse caso, estimulando o córtex pré-frontal dorsolateral, levando à produção de dopamina. A dopamina é um neurotransmissor que, quando liberado, provoca sensação de prazer e bem-estar, além de aumento da motivação”, esclarece a neurocirurgiã.
Dra. Juliana conta que os pacientes, encaminhados ou que a procuram espontaneamente, passam por uma consulta de avaliação. Neste encontro ela avalia a indicação do tratamento e se realmente a aplicação da EMT trará benefícios. A doutora analisa ainda se há alguma contraindicação para a aplicação. “Explico como o processo se dá e faço o planejamento da primeira fase da terapia. Se o paciente estiver de acordo, agendamos o início para os próximos dias”, frisa.
A médica enfatiza que o paciente é submetido a sessões diárias com duração aproximada de 20 minutos cada, por quatro semanas. “A primeira sessão leva mais tempo, cerca de 30 minutos, para que faça as medidas e marcações para estimular a área correta. Os dados são registrados numa touca que será usada pelo paciente até o fim do tratamento”, descreve a especialista. Semanalmente são reavaliados os parâmetros da estimulação de acordo com o limiar de cada paciente, que pode variar.
Conforme informações da doutora, o que diferencia a aplicação do tratamento para as diferentes doenças é principalmente a área do cérebro de interesse e se o intuito será o de estimular ou inibir a função cerebral, dependendo da frequência dos pulsos.
O sucesso da terapia é medido pela redução ou pelo desaparecimento dos sintomas da depressão. Baseado nos resultados, é também possível diminuir ou até mesmo suspender os medicamentos antidepressivos. “As melhoras são consistentes e duradouras, mas em até 15% dos casos os sintomas podem voltar”, observa a médica.
No Brasil não há ainda estudos sobre o sucesso da terapia. Pesquisas internacionais indicam que na depressão os pacientes apresentam melhora significativa dos sintomas em quatro semanas e que a chance de recidiva é menor do que com o tratamento medicamentoso. (Confira uma das pesquisas: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/29153439/)
Curiosidades
– Segundo dados do Ministério da Saúde, a depressão afeta cerca de 10 milhões de brasileiros, com maior prevalência nas faixas etárias mais elevadas. Até 2030, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que a depressão ocupará a posição de doença mais comum no mundo;
– Na aplicação para depressão o EMT pode, em quase todos os casos (com exceção para quadros paranoides), substituir a eletroconvulsoterapia, o “famoso” tratamento de choque, com inúmeras vantagens;
– Na depressão pós-parto, situação em que a possibilidade de tratamento medicamentoso é muito restrita porque a mulher amamenta, o tratamento com EMT já é a primeira escolha em muitos países, mas no Brasil sequer é conhecido pela maioria dos obstetras;
– O uso da EMT no tratamento de sintomas motores, como lentidão e tremor, na Doença de Parkinson, ainda está em fase experimental. Mas no tratamento de sintomas não motores, como depressão, fadiga e dor, o benefício é bem conhecido;
– O número de sessões necessárias para se obter um resultado gratificante é, em geral, de 20 a 35 sessões, conforme a doença em questão;
– O valor médio da sessão é de R$ 600,00. O alto custo impede a popularização do tratamento;
– A aplicação da EMT pode ser feita por médico, enfermeiro ou fisioterapeuta treinados. Mas a indicação e o planejamento só podem ser feitos por um médico;
Sobre a Dra. Juliana Zuiani
Formada em Medicina pela Unicamp, onde também fez Residência Médica em Neurocirurgia;
Especialização em Neurocirurgia Funcional na Universidade de Toronto – Canadá, e aperfeiçoamento na Cleveland Clinic – EUA;
Especialização em microcirurgia no ICNE – SP com o Prof. Dr. Evandro de Oliveira;
Título de especialista em Neurocirurgia;
Membro da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia e da Sociedade Brasileira de Estereotaxia e Neurocirurgia Funcional;
Coordenadora da Divisão de Neurocirurgia Funcional do Hospital da PUC Campinas.
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