Artigo por Lesliê Mourad, sócia do FCQ Advogados

 

O Brasil estuda a possibilidade de ter acesso aos dados da população por meio das operadoras de celulares com o intuito de identificar aglomerações

 

Esse controle é realizado na China e na Coreia do Sul, por exemplo. O uso de ferramentas tecnológicas nesses países tem se mostrado de grande valia para o enfrentamento da pandemia e, por esta razão, é cogitada para a realidade nacional.

O sistema de monitoramento começou a ser testado no último dia 8/04 no Estado de São Paulo, com base em dados cedidos pelas concessionárias Vivo, Claro, Oi e Tim. Essas operadoras passarão a monitorar o isolamento social em todo o Estado durante a quarentena.

A utilização desses dados permite acompanhar a velocidade com que o vírus se espalha por determinadas áreas, bem como identificar as regiões com mais risco de contágio. A própria Organização Mundial da Saúde (OMS) reconhece que o rastreamento dos contatos é a forma mais eficaz de combater a propagação da pandemia da COVID-19.

Por meio desse monitoramento, é possível identificar por onde as pessoas infectadas transitaram em períodos passados. Trata-se, portanto, de um recurso relevante que pode salvar milhares de vidas.

.

Lesliê Mourad
Lesliê Mourad, sócia do FCQ Advogados

.

Contudo, no Brasil, do ponto de vista jurídico, esbarramos no direito à privacidade, dentre as garantias individuais que devem ser preservadas. Isso porque, por meio desse monitoramento, seria admissível ter acesso, em tese, a informações privilegiadas, com possibilidade de posterior uso indevido desses dados. Atualmente, exatamente por isso, o compartilhamento de dados em nosso País só é possível mediante autorização judicial.

O objetivo de qualquer medida de controle, então, deve ser, exclusivamente, o de utilizar esses dados para fazer monitoramento de pessoas com a finalidade de garantir o distanciamento social e a identificação de focos existentes, evitando-se a propagação do vírus.

Os dados coletados pelas operadoras de telefonia não as tornam titulares dessas informações; muito pelo contrário, elas apenas podem utilizá-las para o desenvolvimento de sua atividade. Portanto, o compartilhamento desses dados, salvo a já mencionada possibilidade de determinação judicial, dependeria de expressa autorização do titular.

A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), que entrará em vigor em agosto de 2020, dispõe acerca do princípio da finalidade como uma das condições para a licitude da atividade de tratamento de dados. Não há previsão legal em nosso ordenamento jurídico, de todo modo, para o compartilhamento de indicativos de geolocalização. Dessa forma, para que haja esse compartilhamento, far-se-ia necessária a edição de lei prevendo as garantias necessárias, bem como a finalidade exclusiva de resguardo ao direito a vida, diante do cenário de pandemia, e a exclusão dos dados com a normalização da situação.

Sem a edição da aludida lei, ainda que em situação emergencial, entendemos que a medida seria inconstitucional, uma vez que fere princípios fundamentais, como a inviolabilidade da vida privada e a liberdade de locomoção, previstos na Constituição Federal.

Feitas essas considerações, concluímos que o uso dos dados deve ter a finalidade exclusiva da preservação da vida humana. Jamais poderá haver a utilização destas informações pelo Governo, com qualquer outro propósito. Portanto, com intuito de combater a pandemia, a presente medida pode ser utilizada, sim, desde que seja editada por lei, com garantia de preservação da privacidade dos cidadãos, bem como com a devida fiscalização dos órgãos que vão controlar esses dados, para evitar qualquer tipo de abuso.

 

Sobre Lesliê Mourad

 

Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Santos, com Pós em Direito Tributário pelo Centro de Extensão Universitária; Extensão em Contabilidade Tributária pela Fundação Armando Alves Penteado e MBA em Gestão Estratégica de Negócios pela Universidade de São Paulo. No FCQ Advogados, é responsável pela Área Tributária.

 

Informações à Imprensa

 

Kátia Nunes/ Bianca Massafera/ Yasmin Rachid
(19) 3295-7000/ (19) 99751-0555

 

ASPECTOS LEGAIS do MONITORAMENTO DE CELULARES PARA CONTENÇÃO DA COVID-19 1

Deixe seu comentário

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.