Como uma das principais instituições financeiras responsáveis por financiamento agrícolas, as cooperativas de crédito devem se atentar aos riscos potenciais; advogado elenca principais sugestões para minimizar possíveis prejuízos
Questões climáticas, elevada taxa de juros, alta nos custos de produção e outros fatores econômicos desafiadores têm aumentado os pedidos de recuperação judicial no agronegócio. Segundo a Serasa Experian, no ano passado foram registradas 127 solicitações de produtores rurais. O número representa um aumento de 535% na comparação a 2022.
E este número não para de crescer. Um levantamento mais recente do Serasa aponta que, somente no primeiro trimestre de 2024, foram registrados 106 pedidos de recuperação judicial — um salto de 523% na comparação entre trimestres.
Atualmente, há uma grande parcela do setor agrícola que é atendida por cooperativas de crédito: em 2023, o crédito rural total concedido por cooperativas atingiu R$ 281,9 bilhões — o que representa um aumento de 18,6% em relação ao ano anterior. Os dados são do relatório “Panorama do Sistema Nacional de Crédito Cooperativo 2023”.
Por esse motivo, as cooperativas de crédito também acabam sendo impactadas pelos entraves financeiros enfrentados por parte das empresas agrícolas.
Embora seja um dos setores que mais crescem na economia brasileira — são 15,5 milhões de pessoas e empresas no Brasil que aderiram ao crédito cooperativo, conforme dados do Fundo Garantidor do Cooperativismo de Crédito e do Banco Central (FGCoop/BCB), divulgados em 2023 — as cooperativas de crédito ainda atuam de maneira distinta das instituições financeiras tradicionais nestes casos.
Felipe Reis, advogado mestre em Direitos Coletivos, Cidadania e Função Social e CEO do escritório Reis Advogados, explica que, embora haja proteção legal por parte da lei, o aumento da inadimplência oferece riscos específicos às cooperativas.
“Por serem empresas menores, se comparadas às grandes instituições financeiras, as cooperativas atuam em parceria com seus cooperados — o que significa que sua durabilidade depende também da durabilidade de seus cooperados. Por isso, essas instituições devem dedicar atenção especial às maneiras de manterem sua estabilidade e cumprirem seu papel social.”
Inadimplência como principal fator de risco
Estabelecida pela lei 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, a recuperação judicial tornou-se essencial para evitar que grandes empresas quebrassem e, consequentemente, afetasse diretamente a economia brasileira. No entanto, uma série de mudanças ao longo dos anos fez com que instituições financeiras tradicionais e cooperativas de crédito tivessem orientações específicas para estes casos.
Uma das principais mudanças legislativas foi a inclusão do §13 ao artigo 6º da lei de 2005, incluído pela Lei 14.112/2020, que estabelece que os contratos e obrigações decorrentes dos atos cooperativos não se sujeitam aos efeitos da recuperação judicial. Embora as dívidas provenientes de atos cooperativos estejam protegidas por lei e não sejam diretamente afetadas, o aumento geral da inadimplência entre os cooperados pode gerar um impacto indireto que se estende a pessoas e empresas de diferentes setores.
Como ressalta Felipe Reis, “a realidade é que, com muitos cooperados devendo ao mesmo tempo, as cooperativas de crédito podem acabar sendo pressionadas de outras formas. As cooperativas precisam estar preparadas para enfrentar o impacto indireto, que inclui a necessidade de ajustar suas estratégias de crédito e gerenciamento de risco para manter sua saúde financeira.”
Quando um grande número de produtores entra com um plano de recuperação, a capacidade deles de cumprir com outras obrigações financeiras pode se deteriorar, incluindo as relacionadas a empréstimos e financiamentos obtidos de cooperativas de crédito. A instabilidade financeira dos cooperados pode criar um ambiente desafiador para as cooperativas, exigindo medidas adicionais para manter a saúde financeira e a sustentabilidade a longo prazo.
“Enquanto o processo visa preservar a atividade econômica, ele também impõe novos desafios às cooperativas de crédito que atendem o setor agrícola”, destaca Reis.
Medidas preventivas para cooperativas de crédito
Ainda que o risco de inadimplência seja real e possa afetar milhares de beneficiados pelas cooperativas, existem algumas maneiras de evitar que as cooperativas tenham que lidar com altas taxas de débitos em aberto.
Felipe Reis defende que o planejamento organizacional e análises prévias são fundamentais para mitigar os possíveis riscos causados por descumprimentos ou atrasos de pagamentos por parte dos cooperados. Para o advogado, alternativas adicionais de garantias contratuais são essenciais para as cooperativas.
“Mesmo com a proteção jurídica garantida pela alteração na lei, é de extrema importância que as cooperativas encontrem soluções para evitar prejuízos, especialmente, considerando sua crescente importância no mercado financeiro brasileiro”.
Reis elenca algumas possibilidades de prevenção de risco para as cooperativas, entre elas:
- Diversificação da carteira de crédito: para evitar uma concentração excessiva em um único setor ou grupo de cooperados, a diversificação é essencial para as cooperativas terem outras fontes de rendimento;
- Avaliação de risco: implementar um sistema rigoroso de avaliação de risco para os novos empréstimos e financiamentos, considerando a saúde financeira dos cooperados e as condições do mercado;
- Políticas de crédito: estabelecer critérios claros, rigorosos e bem definidos para concessão de empréstimos e financiamentos.
- Due dilligence: conhecida como um procedimento de pesquisa aprofundada a respeito de uma empresa, a due dilligence (diligência devida) é uma análise cada vez mais comum no setor financeiro. Com uma análise detalhada da saúde financeira e do histórico de crédito de uma empresa, as cooperativas podem detectar sinais de imprudência financeira e evitar a concessão de crédito a entidades com maior risco de futura inadimplência.
- Cláusulas contratuais protetivas: cláusulas de garantia, penalidades por não pagamento e condições que possibilitem a revisão das condições do contrato em caso de deterioração financeira do devedor são algumas formas de garantir proteção adicional.
“São medidas que, em um primeiro momento, podem parecer simplórias frente à complexidade de um processo de recuperação judicial. Mas se executadas em conjunto desde o início, aliadas a um bom relacionamento entre cooperativa e cooperados, já garantem saídas muito mais eficientes e seguras”, finaliza Felipe Reis.
Sobre o Reis Advogados
Fundado pelo Dr. Paulo Roberto Joaquim dos Reis, o Reis Advogados mantém um compromisso contínuo com o desenvolvimento de gestão, tecnologia e excelência operacional. Referência no segmento financeiro, o escritório expandiu sua atuação ao longo dos anos e atende hoje empresas do setor Cooperativo, Energia, Securitário e da Construção Civil atuando em Recuperação de Crédito, Contencioso Consumerista e Trabalhista Empresarial.
Contando com mais de 600 colaboradores alocados por todo território nacional, tem em seu portfólio as principais instituições financeiras do país, se consolidando como um dos maiores escritórios de advocacia do mercado corporativo.
Além da sua sede em Bebedouro, o Reis Advogados conta com unidades em São Paulo e Ribeirão Preto (SP), Rio de Janeiro (RJ), Belo Horizonte (MG), Porto Alegre (RS), Florianópolis (SC), Curitiba (PR) e no exterior, em Oeiras (Portugal).
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